Do que faz crescer, m(eu) pedaço mãe.

Quando minha mãe faleceu e a ganhei de outra forma (pois não acho que a perdi, apenas a tenho agora de uma maneira diferente da que tinha antes), não imaginava o quanto ainda tinha a aprender com ela. E falo dos aprendizados mais fortes aos mais bobos. Por exemplo, eu jurava que quando a pessoa morria, ela ficava gelada automaticamente, mas não, tudo tem seu tempo e foi minha mãe quem me ensinou. No dia do velório dela, cheguei mais cedo para terminar de arrumá-la, calcei-lhe meias e sapatos, comprados para combinar com a roupa que usava, bem confortáveis. Depois fui maquiá-la do jeitinho que ela sempre fazia e como me ensinou sem perceber. Dei-lhe cor, para um momento de despedida, e não tive medo. Dessa vez seu corpo já demonstrava os efeitos de um dia pro outro, mais enrijecido. Era estranho tentar mexer-lhe as mãos sem ter uma reação de volta, ainda assim (e mais uma vez),  não tive medo, ela continuava a ser minha mãe, minha mãe durinha, de batom e bochechas rosadas, calçada confortavelmente para onde quer que estivesse indo. Hoje fico observando as mulheres mais velhas nas ruas e tento perceber se existe alguém capaz de tornar mais uma vez real o que tenho dela em memória... sua voz, o formato de seu cabelo, seu jeito... mas é mais difícil do que eu imaginava. O que tenho medo mesmo é de que a memória com o passar do tempo algum dia me traia. Mal lembro das minhas histórias infantis, só algumas. E nem quero imaginar pensar perder minha mãe de alguma forma. Agora o mais engraçado é que já a vejo em mim. Em pensamentos, em atitudes, em gestos, em aparência. E isso sim, é mais uma nova experiência que ela tem me proporcionado. É engraçado alguém que não está presente, continuar presente. Quem sabe seja isso mesmo o amor, esse sentimento que fica, independente do tempo, refletindo e transformando o que se aprendeu, que pode ser algo diferente, incomum, mas que também é bom. Amor de mãe. Amãe. 



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