Da série: Isso é coisa da Bahia. Crônica 2.


Salvador, 19 de junho de 2014

Pedaços de Red River.

Daí que você sai pra desopilar em plena quarta, pré-feriado, já pensando no vizinho do capeta tuntz tuntz. No meio da conversa de largo, tomando um cereal (pq cevada com teor alcoólico a vera aqui é artigo de luxo), uma confusão, corre-corre, aí você sabe que a porra empenou quando começam o quebra-quebra de garrafas e cadeiras... Pronto, era pra ter emoção, mas nem tanta. Chega a polícia, os envolvidos defendem suas teses, parece que certo tipo de gente abonada resolveu não pagar a conta. E justamente a conta do local do cereal. O garçom passa nervoso: "a gente aqui trabalhando o dia todo, e essas misera quer sair sem pagar...". O primeiro ato da história é revelado. Já observando o trabalhador mais calmo, resolvo pedir um outro copo, que em meio a confusão se perdeu. Um amigo brinca que joguei no meio da briga. O garçom retruca: 'era pra picar* na cara deles!'. Segundo ato, uns quatro meninos bombadinhos de canela fina, assim falando bem por estereótipos, argumentam que roubaram o celular de um deles. Mas o que é que você faz quando te levam o celular? Dá queixa e procura a resolução de forma legal. Resposta errada. Na lógica desses queridos, ou melhor, 'dessas misera' (APUD Garçom), é fazer vingaçinha com o bar, que você acusa sem provas, e sair sem pagar a conta. Quer dizer... A questão é que os caras não contavam com a astúcia de Chapolin, digo, de uma comunidade toda que não tá ali de brincadeira, quase dão margem pra uma grande tragédia. Na verdade, e no final da confusão, a tragédia de um joelho sangrando. Graças a Jah. Nenhuma violência é benéfica e/ou apenas justificável. Sei que após muito lero, os que se dizem da 'justiça' levaram todos os envolvidos pra conversar naquele carro com luzes de boate. Penso eu, findada a noite, chega de emoção que o coração não aguenta (chega de emoção que o coração não aguenta). Chama a saideira, mas antes do caminho para casa, um simples pastel pra evitar a dita ressaca do dia que já começa a raiar, traz mais emoção pra noite que não, não está findada. Segue diálogo:

- Velho, porque lá no Rio... blá blá blá blá (e seguem histórias de sagas baianas em terras cariocas).
- Odeio carioca!
- ... (uma pausa pra o momento cara de indagação: é com a gente?)

Dalí em diante, a barraca de pastel tornou-se uma barrocoterapia, em que um sujeito inflamado falava de sua revolta com os cariocas, a ponto de fazer todos rirem com os seus argumentos desargumentados. Lia-se facilmente algum tipo de trauma em suas palavras. Em dado momento, um novo diálogo se abre, e [PAUSA] para um dos momentos mais geniais da madrugada:

- Não tem isso de bom e ruim não, tem gente boa e ruim em qualquer lugar. Eu mesmo vou falar uma coisa, que pode até ofender vocês, mas eu queria mesmo era trabalhar no zoológico. Lá tem os animais entendeu, ficar alimentando os animais e pronto. Ser humano é uma disgraça! Cê quer ver... duas coisas que não acredito, você vai chegar pra mim e falar, 'sou psicóloga'. Psicóloga?? Você acha que eu vô acreditar nisso véi, que você vai saber o que tá dentro de minha MEN-TE (um conjunto mímico com os dedos enviesados apontados para cabeça compunham o discurso). E outra, é você dizer sou 'metereologista', é o quê? Véi, é a natureza, é a NA-TU-RE-ZA!!! Aí cê vai ver o jogo aqui. Na TV o cara dizendo que vai chover com pancada de água, aí na hora do jogo maluco, uma sol da porra, escaldante, Cristiano Ronaldo tinham nem entrado em campo e já tava suando. Eu vou acreditar nisso, véi?!

Terminado o monólogo-desabafo, com muita propriedade há de se registrar, uma menina que também observava o discurso solta no ar que estava se sentindo enjoada, tinha tomado algumas muitas cervejas e comido dois pastéis, Comentei que ela devia estar numa fase consequência desse antes, daí que acontece o momento [PAUSA - Parte 2]. Um senhor se aproxima segurando uma piriguete** e larga:

- Poxa, eu queria ser que nem vocês...
- ....
- É, ficar enjoado também. Tou tomando uma (cerveja) desde ontem e até agora não enjoei.

Fim de noite. Revelando que é quando a gente menos espera, que as maiores pérolas acontecem e aparecem. E claro, já era chegada a hora de descansar a mente, já que a memória não tinha mais como registrar tanta figura de vez. Me desculpem os extras-território-do-dendê, mas isso é coisa da Bahia, mô fio.


*picar, variante também do 'meter-le a disgraça' e com proximidade espacial. Também pode ser substituído em determinados casos, e de maior distância, por 'rumar'. 
**piriguete, da família dos latões de cerveja, espécie de filha mais nova, mais magrela, mais barata. 




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